Era um dia
claro, sem muitas nuvens no céu. Ele acabara de acordar, ainda vestia o pijama
todo amassado e calçava o chinelo, enquanto caminhava para a cozinha, para fazer
o tão tradicional café preto.
Era domingo,
não tinha empregada, tinha que fazer tudo sozinho.
- Ai que
fome, o que será que tem na geladeira!
A geladeira
estava mais vazia que barriga de mendigo.
- Ah não,
só me falta não ter mais café, essas empregadas de hoje em dia!
Ao abrir o
armário, lá estava o pote de café. Ele subira numa cadeira para tentar pegar o
pote, mas ao encostar os dedos viu que o pote não tinha nada.
- Oh Deus,
me ajude por favor.
Ele corria
para o quarto, trocava de roupa rapidamente e ajeitava os cabelos
arrepiados.
Colocou o
agasalho, pois aparentava estar um dia frio, pegou a carteira e saiu fechando
a porta do apartamento.
Ainda era
cedo, mal o sol tinha nascido ainda. No condomínio mal tinha gente andando por
ele. Mas ao sair encontrou o Seu João, e o respondeu:
- Como vai
camarada?
- Vou bem e
o senhor?
- Levando a
vida né...
- Alguma
novidade? Disse Seu João se afastando.
- Nenhuma.
O dia
estava quente, e nem um pouquinho frio, tirara o agasalho e botou nos ombros. E
ainda resmungara.
- Esse
tempo doido, sempre mudando.
- Porteiro!
Gritava ele.
E o
porteiro abriu a porta para ele sair. De onde ele estava, a padaria parecia ser
longe.
E foi
caminhando...
Logo depois
do condomínio, tinha um barzinho, lá se encontrava um homem, visivelmente
bêbado.
- Oi. Dizia
o bêbado fortemente, o fazendo parar.
- Oi.
- Sabe quem
eu sou?
- Um
bêbado. Dizia em um tom de ironia.
- Não diga,
foi tão difícil assim perceber.
Realmente
aquele dia ele acordara de pé esquerdo.
- Cara,
continua bebendo aí que eu vou comprar minha comida.
- Que é
cara? Disse ele se levantando.
- Hã?
- Tu vai me
ignorar só porquê eu estou bêbado? só porque sou zé ninguém, é isso? SEU
HIPOCRITA! Gritava ele.
- Cara tu
pegou o cara errado, hoje eu acordei de mal humor.
O bêbado
foi para cima dele, e sem dificuldades ele deu um murro que o bêbado caiu no
chão gemendo de dor.
- Que merda
essa? Dizia o dono do bar, Senhor Miguel.
- Nisso que
dá, deixar o bar aberto 24 horas, pra vagabundo beber.
Ele
aproveitou que outras pessoas chegaram para ajudar o bêbado caído e saiu para a
padaria.
E nesse
tempo, já inconformado de ter tantas pessoas o ajudando, resmungava, como se
tivesse falando com alguém.
- Esse
mundo esta perdido mesmo viu, até vagabundo tem mais direito que a gente.
Ele ficara
muito inconformado, se julgava o exemplar cidadão, dava moeda aos pobres,
separava seu lixo, fazia tudo aquilo que a sociedade mandava. Para ser um cidadão
exemplar, seguia à risca, as regras.
Com as
sacolas na mão e com sua boca “afiada”, foi em rumo ao seu condomínio, andava
de olho no bar e no bêbado consolado agora por um rapaz, que já se despedia
dele.
O bêbado já
olhava para ele, e ele devolvia o mesmo olhar, o coração batia frenético ao
chegar perto.
- E ai
covarde, vai me ignorar de novo? Disse o bêbado rindo da cara dele, ria de
jeito tão natural, que arranha a pouca lucidez que lhe sobrava.
Ele nunca
se sentira tão humilhado. E para piorar na hora que o bêbado riu dele, ao
levantar a cabeça, viu outros mais a frente rindo. Se viu cheio de razão nesse
momento, na verdade ele tinha tudo, menos razão na sua cabeça. O homem lucido e
certo, ali se entregava a verdadeira forma, caía-lhe a máscara imposta para
usar.
O monstro
se revelava.
E um único
chute derrubou o cadeira do bêbado, fazendo-o cair no chão, e a cadeira se
espatifar.
- Já não
basta o que tu fez e agora quer me bater.
- O QUE EU
FIZ SEU RETARDADO? O monstro disse gritando.
E ao correr
deu um chute na cabeça do pobre bêbado, fazendo sua boca sangrar e sujar a
rua.
Na mesma
hora algumas pessoas correram para segura-lo, e assim fizeram.
- Que foi
seu bêbado imundo? Você é um zé ninguém! Dizia ele achando estar cheio de
razão.
O bêbado se
levantou, e disse:
- Eu sou um
zé ninguém mesmo, nunca neguei isso. Melhor do que ser um falso.
Os vizinhos
do seu apartamento, já o olhavam do outro lado da rua, já os via com
rostos de negação, e outras pessoas também.
O monstro
se revelava, o homem que jaz ali, não existe mais, tamanha foi a humilhação
para ele, que a razão se perdeu dentro de si.
Jogou as
sacolas no chão, fazendo varias coisas quebrarem e derramar a manteiga, o
leite, e a garrafa de vinho, entre outras coisas.
- Tudo bem,
desculpas cara, eu perdi o controle.
E assim o
saltaram, deixando ele livre de qualquer amarra, assim o monstro esta solto,
para fazer o que bem entender.
O bêbado se
levantou e foi em direção a ele. Na visão do monstro, pensou que levaria um
murro, na visão do bêbado era apenas um abraço, de desculpas.
O bêbado o
abraçou e fincou no seu rosto, uma cara de espanto, a boca sangrando,
semiaberta e paralisada no meio de tantas pessoas.
O monstro
sorria na sua loucura, até o homem voltar a si e se desesperar. O monstro
quando ameaçado, não perdoa, no movimento que bêbado fez para cima dele, pegou
o gargalo no chão e o fincou na barriga do pobre bêbado, no momento em que ele
o abraçara.
O corpo
caia ao chão, e o homem que o feriu se desesperara, correu para seu prédio,
fugindo dos homens que o queriam, se trancou no seu apartamento, e ficou no
parapeito do seu prédio a admirar o chão que ficava na entrada. O corpo nas
alturas, o chão distante, depois de alguns segundos, o chão e o corpo, na mesma
dimensão.
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